sábado, 19 de setembro de 2009

SAPUCAÍ - 25 ANOS

Clarissa Thomé

Faz 25 anos que a Império do Marangá se tornou a primeira escola a pisar o asfalto da Avenida Marquês de Sapucaí, inaugurando o Sambódromo. A agremiação não resistiu à profissionalização do carnaval e desapareceu nos anos 1990. Mas a inauguração da Passarela Darcy Ribeiro, nome oficial da avenida dos desfiles, mudaria definitivamente o destino do carnaval carioca.

Até 1984, havia um monta e desmonta de arquibancadas na Avenida Presidente Vargas. "Toda a subvenção do governo ia para as empreiteiras, para a montagem. A inauguração do Sambódromo deu liberdade às escolas", diz o historiador do samba e coordenador do Centro de Memória da Liga das Escolas de Samba (Liesa), Hiram Araújo.

A iniciativa do Sambódromo partiu do antropólogo Darcy Ribeiro, durante o governo de Leonel Brizola. O arquiteto Oscar Niemeyer foi chamado para fazer o projeto. Além da Passarela do Samba, o local deveria abrigar salas de aula, para que o espaço funcionasse durante o ano todo. E assim é até hoje. São três escolas e uma creche para 780 crianças, além de um núcleo de artes.

Ao longo de duas décadas e meia, o Sambódromo foi palco de carnavais memoráveis, como o do samba-enredo Ratos e Urubus, Rasguem a Minha Fantasia, em que Joãosinho Trinta, conhecido como o carnavalesco do luxo, levou mendigos para a avenida, no desfile da Beija-Flor; ou Quizomba, Festa da Raça, que deu o primeiro campeonato à Vila Isabel, com enredo de Martinho da Vila e samba de Luiz Carlos da Vila. A escola pobre conquistou o título com um desfile artesanal. E a Grande Rio promete lembrar esses grandes carnavais no desfile de 2010, quando terá o Sambódromo por enredo.

LÁGRIMAS

Já teve astronauta voando por sobre a passarela, na apresentação da Grande Rio, em 2001 (ideia de Joãosinho Trinta). E a plateia foi surpreendida por alegorias humanas, marca registrada do carnavalesco Paulo Barros, com o inovador carro do DNA da Unidos da Tijuca, em 2004.


A festa também é de tragédias, dores e tristezas. Em 1992, um incêndio num dos carros da Viradouro roubou o título da escola de Niterói - num enredo sobre o mundo cigano, perdeu 13 pontos por atraso. A atriz Neusa Borges também passou por maus momentos - caiu do alto de um carro da Unidos da Tijuca em 2003. Ficou meses de muleta e processou a escola.

As lágrimas dos componentes da velha-guarda da Portela, impedida de desfilar no carnaval de 2005, comoveram o público e integrantes das outras escolas. A agremiação de Madureira, inchada de turistas, cortou a ala tradicional para não atrasar o desfile. Também foi marcante a expulsão da cantora Beth Carvalho, mangueirense histórica, do carro dos baluartes no carnaval retrasado. Beth alegava problemas na coluna para não sair no chão.

OUSADIAS

A Sapucaí é palco principalmente de ousadias. A começar pela modelo Enoli Lara, que em 1989 desfilou completamente nua na União da Ilha. No ano seguinte, foi cunhado o termo "genitália desnuda" para a proibição da prática. A também modelo Lilian Ramos ignorou a regra. Num camarote, posou para fotos ao lado do então presidente Itamar Franco, trajando apenas uma camiseta, em 1994.

Dercy Gonçalves nem precisou mostrar tudo para causar alvoroço. Os seios de fora, aos 84 anos, foram suficientes para tornarem a atriz o assunto do carnaval de 1991. No ano passado, a polêmica da nudez voltou à passarela do samba. A modelo Viviane Castro usou um tapa-sexo de apenas 3,5 centímetros. Nem os jurados enxergaram o aparato e a moça causou a perda de 0,5 ponto à São Clemente, que foi rebaixada.

Mas a Passarela do Samba não é unanimidade. Por baixo dela corre o Rio Papa-Couve, que enche nos temporais. O desfile das campeãs foi suspenso quando a avenida inundou em 1988. Da concentração para o Sambódromo há uma curva acentuada que já atrapalhou o carnaval de muitas agremiações. "É uma curva de 180° difícil para carros grandes", diz Hiram Araújo.

A carnavalesca Maria Augusta também fala de determinados pontos da avenida em que há forte corrente de vento, capaz de fechar a bandeira da escola. "Se isso acontecer, a escola perde ponto no quesito mestre-sala e porta-bandeira. Ao longo dos anos, as porta-bandeiras descobriram um truque: elas molham a bandeira. O que é preciso é descobrir o ponto certo para molhar", ensina.

CONFRATERNIZAÇÃO

Darcy Ribeiro e o arquiteto Oscar Niemeyer idealizaram, no fim da avenida, uma praça onde deveria haver uma confraternização entre os integrantes da escola e o público. Somente uma vez isso aconteceu: quando a Mangueira encerrou o desfile de 1984 e, seguida pela plateia que descia das arquibancadas, fez a volta e desfilou novamente. Hoje, a Praça da Apoteose é um corre-corre de escolas ávidas para liberar o espaço e não perder pontos por atraso.

Alheio à polêmica, Niemeyer tem carinho pelo Sambódromo. "É um projeto para o povo, para a alegria do povo", comentou.

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